sábado, 30 de julho de 2011

A MAGIA DO FUTEBOL

- Maurício Siaines

O futebol movimentou energias adormecidas em muitas almas na última quarta-feira, 27 de julho. Nova Friburgo em particular mobilizou-se com o último jogo da série B do campeonato estadual entre Friburguense e Serra Macaense, às 15h no Estádio Eduardo Guinle. O empate em 2 a 2 deu ao clube da cidade o direito de voltar à primeira divisão do futebol do Rio de Janeiro.
À noite, já às 22h, o Flamengo venceu o Santos, na Vila Belmiro, em Santos, por 5 a 4, em um dos jogos mais extraordinários dos últimos tempos, que foi assunto ... ia dizer que foi assunto em todo o planeta, mas antes que digam que é um exagero de torcedor ... digam o que quiserem, a virada do Flamengo, que aos 25 minutos do primeiro tempo já perdia por 3 a 0 deve ter sido falada no Oriente Médio, no Tibet, na Alemanha, no Canadá e na Patagônia. E no Brasil inteiro, é claro. Em Nova Friburgo o futebol foi combustível para o alto-astral de qualquer pequeno grupo de conhecidos que se encontravam.
Gente afeita à busca da representação de grandes e contraditórias emoções, como o dramaturgo Nélson Rodrigues, ou à decifração de signos da vida social, como o antropólogo Roberto DaMatta, viram no futebol um objeto para onde voltar suas preocupações. Ditadores, como Benito Mussolini (1883-1945) e Emílio Garrastazu Médici (1905-1985), tentaram atrair para si e para sua obra política a energia despertada pelo futebol. Sem dúvida, é algo muito além de um esporte, trata-se de um jogo em que as coisas da vida se fazem representar com razão e emoção.
É claro que o futebol não vai resolver milagrosamente os problemas desta cidade ou de qualquer comunidade humana, mas pode significar uma disposição coletiva para fazê-lo. Um filme de 2003, do diretor alemão Sönke Wortmann, O milagre de Berna, trata do modo como o jogo final a Copa do Mundo de 1954, entre Alemanha e Hungria, representou uma espécie de volta por cima dos alemães, sofridos com as tragédias do nazismo e da Segunda Guerra Mundial. Entre os diversos personagens do filme, Sepp Herberger (1897-1977), o técnico do time alemão, é notável pelo equilíbrio e pela elegância em sua lida com os ânimos dos jogadores e com os jornalistas e, especialmente, pelo modo claro e objetivo como encara os problemas que tem pela frente.
No dia do jogo final contra a seleção da Hungria, a preleção de Herberger a seus jogadores é, ao mesmo tempo, uma análise e uma sutil exortação. Com tranquilidade, ele diz o seguinte:
“Perdemos o primeiro jogo para a Hungria por 8 a 3. Foi doloroso. Mas, como é sabido, todas as coisas boas têm seu lado ruim e vice-versa. O que os oito gols nos ensinaram? A Hungria tem um time fantástico. Não perdem há quatro anos. Além de Lorant, Kocsis, Bozsik e Puskas, eles só têm jogadores que nunca perderam com a camisa da seleção. Mas isto não significa que são imbatíveis. Porque nós também marcamos três gols. Isto quer dizer que são vulneráveis.”
Depois desta introdução, o treinador alemão orientou seus jogadores, e a Alemanha, surpreendentemente, venceu aquele segundo jogo com a Hungria por 3 a 2 e foi campeã do mundo. Que nós, cidadãos de Nova Friburgo, depois da tragédia das chuvas de janeiro, depois das denúncias de mau uso de recursos públicos, aproveitemos as energias liberadas pelo futebol para, com a mesma elegância de Herberger, dar todas as voltas por cima necessárias!
- Maurício Siaines é jornalista e mestre em sociologia


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