Zury Maurer |
Nova Friburgo está em alerta geral por conta dos efeitos ainda bem marcantes por todo o município da tragédia de 12 de janeiro. Tanto é que a preparação para enfrentar mais uma temporada de chuvas fortes com a proximidade do verão é o assunto do momento. O 6º Fórum de Segurança promovido quarta-feira pelo Conselho de Segurança de Nova Friburgo (Conseg-NF) teve apresentação de Zury Maurer, 30 de novembro, à noite, no auditório do Senai, mostrou bem isso.
O espaço ficou superlotado durante pelo menos quatro horas de debates sobre a pergunta que mais aflige a quem vive aqui: Estamos preparados?
O Fórum, que esse ano abriu mão do seu foco principal —a discussão sobre o combate à criminalidade e às drogas — para abordar o que fazer ante as inúmeras consequências de uma das maiores catástrofes climáticas da história, contou ainda com um ciclo de palestras que destacou o motivo de tanta chuva na Região Serrana em tão pouco tempo: como as autoridades estão se mobilizando para reagir ao próximo verão e ainda, como conviver com o estresse emocional comum a uma situação de expectativa e medo como essa, com a população se perguntando “o que poderá acontecer”.
Auditório do Senai-NF totalmente lotado |
Para o presidente do Conseg, o advogado Rodrigo Guimarães, o Fórum serviu como um agente de conscientização dos friburguenses e também dos representantes do poder público quanto à necessidade de se mudar hábitos e conceitos, difundindo-se ações efetivas para combater os efeitos negativos das tempestades no cotidiano.
A geógrafa Ana Luíza Coelho Netto e o biólogo Anderson Mullulo Sato |
Em palestra de abertura do Fórum de Segurança, a geógrafa Ana Luíza Coelho Netto e o biólogo Anderson Mullulo Sato, ambos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) apresentaram um resumo do trabalho de pesquisa sobre a tragédia das chuvas na serra desenvolvido pelo Laboratório de Geohidrologia, Geomorfologia, Hidrologia e Geoecologia, o Instituto de Geociências e o Departamento de Geografia da universidade, que tentou explicar o porquê de tanta chuva concentrada sobre a região durante nove horas seguidas, entre os dias 11 e 12 de janeiro, com precipitações que chegaram a 228 milímetros num só lugar, como o bairro Córrego Dantas.
De acordo com Sato, houve uma imensa concentração de chuva sobre o município intensificada pelo fenômeno climático denominado “zona de convergência do atlântico sul” que suga a umidade da Amazônia para o Sudeste do país e confrontou-se com frentes frias. “Todo mundo hoje se pergunta:
- “Vai acontecer de novo? “.
– “Pode sim, mas não sabemos quando. Não há sustentação científica alguma para afirmar que outra chuva dessas só acontecerá daqui a 500 anos, como tem sido especulado. As condições climáticas estão mudando.”, enfatizou o biólogo, ressaltando a necessidade de prevenção das encostas e desocupação das áreas de risco, visto que, das centenas de deslizamentos que ocorreram em janeiro, 140 deles devastaram áreas superiores a 20 mil metros quadrados.
A geógrafa Ana Luíza Coelho Netto destacou que, além do grande volume de chuva, a combinação ocupação irregular-encostas com solo e florestas degradadas contribuiu para os volumosos escorregamentos que carrearam pedras e muito sedimento para os rios que, obviamente, transbordaram. E alertou:
- “A incidência de mais enchentes no próximo verão é iminente, pois a caixa dos rios está muito assoreada com resíduos de janeiro. Ana Luíza ponderou que Olaria e seu entorno também recebeu grande volume de chuva - 193 milímetros na madrugada de 12 de janeiro -, mas os deslizamentos lá foram menores devido ao relevo menos acidentado e o tipo de solo com florestas mais densas.
- “As chuvas maiores geralmente são à noite e a população precisa saber para onde ir com segurança quando houver os alertas. O desmatamento é outro vilão das tragédias das chuvas. Árvores mais antigas com raízes profundas ajudam a segurar o solo. Por isso, vale mais a pena reflorestar áreas de mata mais antiga que florestas espessas. É aquela máxima: é mais fácil tratar um resfriado do que uma pneumonia. As enormes encostas com blocos rochosos sofreram fraturas que permitem agora maior infiltração de água das chuvas facilitando o deslizamento de pedras em direção ao fundo dos vales e aos rios. A lição que tiramos disso tudo é que temos que prevenir e proteger a população. O que aconteceu em Nova Friburgo pode ser esperado para qualquer verão”, frisou a geógrafa que alertou as autoridades quanto à necessidade de frear a ocupação em áreas de risco e elaborar-se estudos sobre as áreas seguras de expansão habitacional.
João Paulo Mori |
O coordenador da Defesa Civil em Nova Friburgo, tenente-coronel bombeiro João Paulo Mori, garantiu que o órgão está preparado para as chuvas fortes e típicas do próximo verão. Para isso, ele vem dedicando-se à preparação das comunidades incutindo nelas essa nova cultura de convívio com a possibilidade de desastres ambientais como ocorre no Japão com os tsunamis e terremotos.
- “Não há necessidade de pânico quando soarem as sirenes de alerta. A população terá tempo suficiente para rumar de suas casas para os pontos de apoio e após as chuvas retornarem para suas casas. Os alarmes serão sempre acionados duas horas antes do início das tempestades.”, assegurou Mori, que comemora o êxito dos últimos dez simulados realizados em áreas de risco.
Ele frisou ainda a parceria quase certa com operadoras de telefonia móvel para o envio de alertas por torpedos, a instalação de dez estações pluviométricas no município e o monitoramento do nível do Bengalas e da intensidade de chuvas esperada através do site do Instituto Estadual do Ambiente (Inea).
- “As informações precisam ser passadas à população por todos os meios, inclusive pelos radioamadores que contam com uma nova torre, mais potente, e também o velho radinho de pilha que funciona ante um possível colapso das redes de energia e telefonia.”.
Luiz Emmanoel Palencia Barbosa |
Já o comandante do Corpo de Bombeiros, coronel Luiz Emmanoel Palencia Barbosa, enfatizou as ações de prevenção desenvolvidas pela corporação com integração dos órgãos de atendimento e resposta participantes do Comitê de Gestão Estratégica do município. O comandante enfatizou o apoio às ações da Defesa Civil e a implantação do Plano de Apoio Integrado (PAI) que reúne parceiros dos bombeiros para atuação em situações de emergência, como por exemplo, a garantia de cessão de equipamentos pesados de empresas particulares para desobstrução de vias e ações de capacitação das comunidades com o curso de preparação para desastres.
- “Em aulas teóricas e práticas, seis turmas já se prepararam para ajudar os bombeiros e as frentes de emergência, caso necessite, com o aprendizado de confecção de pluviômetros com garrafas pet, como resgatar vítimas em escombros e como transpassar áreas alagadas utilizando boias feitas a partir de garrafas plásticas e calças jeans amarradas. Mais de mil professores já foram treinados e estão comprometidos a repassarem as informações aos alunos, e estes, aos familiares.”, disse Palencia. O Corpo de Bombeiros já ultima ainda o lançamento de um DVD de treinamento de emergência e até a semana que vem, disponibiliza no site www.6gbm.cbmerj.rj.gov.br , um material didático para o enfrentamento às chuvas, com segurança.
Estamos preparados para as próximas chuvas?
Juliana Dantas |
Emocionalmente não, na opinião da psicóloga Juliana Dantas. Em sua palestra no Fórum de Segurança, ela sustentou que não há como se preparar para outro episódio como o de janeiro, pois o trauma foi grande e resta à população absorvê-lo e aprender a conviver com ele.
- “Como se trata esse estresse emocional? Discutindo sobre ele, informando-se sobre as causas e consequências da tempestade e tentando se adaptar à nova realidade do município. É preciso se informar sobre tudo, pois o que não é dito vira fantasma. E fantasmas assustam. O que importa é que não estamos doentes. Todo mundo que vive aqui está abalado e temeroso, sim. ”, sustentou Juliana, enfatizando também a necessidade de se rever conceitos e cuidar da saúde física e mental.
A psicóloga destacou ainda que a população friburguense busca, agora, um novo sentido de vida, pois as perdas de entes queridos e materiais em janeiro figuram ainda hoje como muitas das encostas outrora verdes de Nova Friburgo: fraturas expostas e cicatrizes difíceis de serem fechadas.
- “Estamos sim, muito abalados emocionalmente, mas algumas dores têm que ser sentidas e não devem ser tratadas com remédios. As dores podem ser diluídas com muita conversa, preparo e apoio. É isso que esse município precisa agora: amparo e prevenção.”.
- Texto Henrique Amorim (AVS) e fotos Carlos Pinto
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